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1982 (Oualid Mouaness, 2019)

Foto do escritor: Carol BallanCarol Ballan

Quando pensamos no Líbano, como brasileiros, muitas vezes lembramos da informação massivamente distribuída de que o nosso país contém uma quantidade maior de descendentes de seus imigrantes do que sua própria população atual. E não é à toa que ocorreram diversos fluxos migratórios, dadas as sucessivas crises econômicas e políticas pelas quais a região passou em todo o século XX. O cenário no qual se encontravam em 1982, ano que dá título ao filme de Oualid Mouaness, não poderia ser mais complexo: divididos em uma guerra civil de fundo religioso entre muçulmanos e católicos, foram também bombardeados pelo exército israelense durante a operação Paz na Galileia que visava o enfraquecimento dos palestinos da região, e que foi o golpe final na pouca estabilidade que restava no país.


A sagacidade do roteiro do longa-metragem, também escrito por Mouaness, é que tais informações não são necessárias para compreender sua mensagem, ainda que elas ajudem a dimensionar a gravidade dos conflitos. Colocar o centro da narrativa em uma escola que tenta minimizar o que está acontecendo para manter as crianças calmas é uma escolha sábia no sentido de não precisar mostrar os momentos mais caóticos de conflito enquanto ajuda a construir a tensão ao passar do dia.


E é exatamente por não mostrar claramente os focos do conflito armado, e sim a sua consequência na vida dos civis não envolvidos diretamente com o que estava acontecendo que a obra consegue trazer a tensão sob um ponto de vista menos usual. Das complicações que envolvem a cumplicidade das crianças até o desespero dos pais que desejam pegar seus filhos e levá-los para casa, é possível compreender como uma guerra é traumática para toda a nação. E, compreendendo que há um teor autobiográfico na obra, filmada na mesma escola onde o diretor estudou, percebe-se como as suas consequências influenciarão até as gerações mais jovens envolvidas.


É surpreendente que este seja o primeiro longa-metragem do diretor, dado o equilíbrio encontrado entre conflitos pessoais e sociais, com todos os detalhes do dia-a-dia do protagonista estando alinhados aos maiores problemas - da garota muçulmana que não pode falar com garotos até o irmão da professora que está envolvida na luta armada contra o exército israelense. A tensão é crescente e contrastante com a primeira metade do filme que mostra um coming-of-age envolvendo o primeiro amor do jovem Wissam.


As atuações, principalmente do elenco infantil, também são eficientes para passar a sua mensagem. Eles conseguem transparecer a inocência necessária para que a trama funcione, sendo também importante que Mohamad Dalli, que interpreta Wassam, compreenda bem a sua fisicalidade, o que faz com sucesso. É necessário destacar a participação de Nadine Labaki, que atua como Yasmine e deixa claro o tênue equilíbrio entre a função de professora e a vida pessoal que a situação exige. Mesmo atores com menos tempo de tela estão bem dirigidos, e é possível compreender todas as intenções sem que elas pareçam óbvias ao público,conseguindo a sua atenção de maneira inteligente.


Ainda que o ritmo seja um pouco mais lento que o da maioria dos filmes de guerra, ele consegue transmitir a impaciência através de seu tempo que decorre quase como na vida real. Do mesmo modo, ainda que questões técnicas como fotografia e direção de arte sejam mais simples, a mensagem de empatia e solidariedade são perfeitamente colocadas.


1 982 estreia nesta quinta-feira, 2 de junho nos cinemas, após diversas premiações internacionais. Vale a pena conferi-lo, assim como permanecer "de olho" nos futuros trabalhos do diretor, dado que este é apenas o seu primeiro longa-metragem.

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