Sábado à noite, meio de quarentena. Não estou fazendo nada, como nos últimos 55 sábados à noite, e eis que recebo a mensagem da minha irmã: "Tá passando o Miss Universo". Sou imediatamente transportada no tempo, para tempos mais simples, e ligo a televisão.
2021, e ainda bem, muitas coisas mudaram. Quem está narrando é Ikaro Kadoshi, em uma grata surpresa - mas que me deixa saudosa de suas maravilhosas performances ao vivo, suada, em uma balada onde a cerveja é cara. Ao invés das clássicas narrações sobre uma Miss ser um pouco "cheinha" para a competição - em uma tentativa de negar a gordofobia intrínseca do tipo de concurso - ou o simples "Ah, mas a brasileira é mais bonita e tem que ganhar", vieram comentários contextualizados sobre todas as competidoras, falando mais sobre suas atitudes e questões interessantes do que apenas um comentário sobre o show de beleza que estava sendo exibido. Também ocorreram muitos comentários sobre a história do concurso e sobre o momento de pandemia, o que fez com que o andamento da noite não tivesse o foco único no padrão de beleza, que, é claro, acaba sendo o elemento principal de um concurso de beleza.
Por outro lado, algo que me impressionou após ficar alguns anos sem assistir à competição foi perceber o quanto as mulheres que ali estavam acabaram se tornando super-mulheres. A vencedora, Andrea Meza, tem 26 anos, e além da carreira nos concursos de beleza, é vegana, pratica cross-fit e é militante de causas feministas. Entre as competidoras, haviam outras que militavam por causas que lhes falassem, fosse o cyberbullyng ou o autismo, e graus de instrução altíssimos. Tudo bem, eu sei que um concurso de miss sempre será elitista, mas por mais que haja avanços em como tratá-lo e como as representações femininas aparecem em tela, é um tanto desesperador pensar no quanto que cada uma daquelas mulheres estava carregando de expectativas sociais e padrões de o que é ser uma mulher em 2021 das costas até as pontas de seus saltos finos.

Fotógrafo: Rodrigo Varela/Getty Images
Enfim, como brasileira, claro que acabei torcendo pela representante do meu país, que em um momento tão caótico poderia receber ao menos esse consolo, mas seguindo os 7x1 de nossas vidas, a candidata brasileira Julia Gama infelizmente ficou em segundo lugar. A gaúcha que largou a vida no Brasil para ser atriz na China também é embaixadora sobre a divulgação sobre hanseníase, provando o ponto de que as métricas de sucesso são cada vez mais surreais.
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