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Crítica | TIFF | Caught by the Tides

Foto do escritor: Carol BallanCarol Ballan

Caught By the Tides (China, 2024) 


Título Original: 风流一代

Direção: Jia Zhang-ke

Roteiro: Wan Jiahuan e Jia Zhang-ke

Elenco principal: Tao Zhao, You Zhou, Zhubin Li, Zhoy Lan, Changchu Xu, Maotao Hu e Jianlin Pan

Duração: 111 minutos


Além do já conhecido gênero de found footage, que emula uma gravação encontrada contando acontecimentos completamente fictícios, Jia Zhang-ke parece inaugurar uma versão na qual se encontra um filme dentro de sua própria cinematografia. Brincadeiras à parte, o diretor afirmou na sessão comentada que durante a pandemia de Covid-19, impedido de filmar, ele decidiu acessar alguns dos materiais presentes em suas produções dos últimos anos. E, considerando a mudança radical da China no contexto da política internacional nos últimos 20 anos, seria inevitável perceber que o tempo por si só já contaria uma história.


cena antiga de filme em caught by the tides

Mas ainda há uma narrativa principal, da personagem Qiao Qiao (Tao Zhao) e seu relacionamento com seu agente Bin (Zhubin Li). Em um primeiro momento eles se separam devido à decisão dele de partir para outra província em busca de mais dinheiro, e então Qiao Qiao passa a procurá-lo por uma região que está sendo desalojada para se tornar uma gigantesca usina hidrelétrica. No entanto, a narrativa é um dos elementos menos importantes para essa trama, que na verdade está abordando a mudança do próprio país ao longo do tempo e dessa personagem criada quase de maneira genérica pelas imagens do passado e que se torna uma nova pessoa nos momentos mais atuais.


O diretor consegue mostrar que, mesmo gravando em momentos distintos e com objetivos distintos, há elementos que nunca foram superados pelo país, como o nacionalismo artificializado e a resiliência feminina. Claro, é até difícil assistir às cenas mais antigas e ao tratamento que Bin dá a Qiao, mas este acaba sendo também um relato de uma realidade que não é mais retratada no cinema da mesma forma, ainda que saibamos que ela segue acontecendo. A própria maneira do diretor de filmar a atriz e também sua esposa é um relato de como os tempos mudaram, assim como as marés, através do tempo.


Aos poucos, o longa-metragem se torna um desafio de linguagem muito bem sucedido. Entramos em um transe com o que está sendo colocado em tela e também ignoramos as barreiras de técnicas de filmagem diferentes ou pequenas mudanças de continuidade devido à impossibilidade da filmagem em um tempo passado. Usa-se a experimentação justamente para causar uma reflexão sobre os custos do processo de modernização e acumulação de capital chinesa, com cenas desesperadoras de perceber as cidades sendo engolidas pela água. Além disso, apoia-se esse pensamento com o próprio desenrolar da trama, com Bin se tornando ocasionalmente um criminoso e Qiao perdendo aos poucos os seus sonhos e se tornando uma mulher endurecida, pouco capaz de sonhar e transmitir suas emoções por conta das décadas de omissões.


Ainda que parte da sensibilidade não possa ser sentida por uma espectadora brasileira que desde a primeira cena se pergunta o que é o dia da mulher na China ou qual é a extensão do dano do patriarcado a essas mulheres, o filme ressoa como um acontecimento único, possível apenas pelas condições bastante raras. E é feliz que haja esse encontro, fazendo refletir em uma arte que se constroi com o tempo a ação do mesmo.


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