Super Mario Bros. - O Filme (Aaron Horvath e Michael Jelenic, 2023)
As expectativas de um novo lançamento de filme inspirado no baixinho mais famoso dos videogames não eram exatamente promissoras, após alguns fracassos em tentativas anteriores. Somado a isso, existe o fato de que a Nintendo vem perdendo valor e mercado com o passar dos anos. No entanto, ao saber utilizar a nostalgia e a recompensa aos fãs de maneira correta, além de criar um roteiro que agrada crianças, a parceria entre Universal e Nintendo consegue acertar em cheio e criar um filme com uma experiência bastante agradável.

Com os muitos lançamentos dos últimos anos que estreitaram a relação entre o universo nerd/geek e o cinema, que vão desde a explosão da Marvel até reviver franquias clássicas como Planeta dos Macacos e King Kong, muito se teoriza sobre qual seria o limite ao fan service (utilização de detalhes não necessariamente pertinentes ao roteiro para acenar ao público que já conhece parte da franquia). Se eles podem ser considerados um dos fatores que atrapalha o andamento da trilogia O Hobbit por conta do culto ao Senhor dos Anéis, seria sábio evitá-los ao falar sobre um personagem que faz sucesso há 40 anos, em mais de 200 jogos?
A resposta encontrada pelos parceiros na produção do filme é que seria impossível evitar sua utilização, então é muito mais interessante usá-los de maneira inteligente e até cômica. Da falta de sentido do traje de raposa do personagem principal até a inclusão de Luma, um personagem que só surge nos anos 2000, o material dos jogos é sempre utilizado. É impossível para alguém que passou noites jogando Mario Party 3 e que pedia ao pai para ajudar a pegar a estrela da Enguia em Super Mario 64, não se emocionar ao ouvir as primeiras notas da música-tema.
Então, se o público millenial é atraído pela nostalgia, é necessário ao filme conseguir atrair o seu maior foco, o público infantil que muitas vezes ainda não teve acesso ao universo dos games. A solução encontrada é um roteiro simples, mas que utiliza os personagens de modo carismático. Um super-herói improvável e implacável, uma princesa que não deixará seus súditos serem exterminados, um vilão com uma motivação peculiar - tudo o que a Nintendo fez corretamente ao longo dos anos foi aproveitado de maneira positiva para apresentar o conteúdo à nova geração.
Resta então um elemento importante: o visual. É impressionante o trabalho realizado nesta parceria, pois ao mesmo tempo que se consegue manter os visuais clássicos dos personagens, é perceptível o traço digital da Illumination em todos os frames. Novamente, a colaboração funciona melhor do que o isolamento, e se há cenas que remetem ao universo bidimensional do NES (também conhecido no Brasil como Nintendinho), o que é realizado pensando no 3D também não deixa a desejar. É importante dizer que a versão assistida foi a dublada, que funciona muito bem dada a boa qualidade da equipe de dublagem, não sendo possível comentar a escalação de astros hollywoodianos para os papéis.
Para a menina que zerou o jogo com o pai já falecido até a adolescente nerd cuja noite diferente era passada jogando Mario Kart, o filme é, apesar de simples, delicioso. Apesar de não ser uma experiência super complexa de animação ou mesmo um estudo de personagens excepcional, é possível simplesmente sentar e aproveitar os 100 minutos de maneira leve.
A distribuição do filme no Brasil está sendo realizada pela Universal Pictures Brasil. Verifique a programação na sua cidade.
Broker - Uma Nova Chance (Hirokazu Kore-eda, 2023)
Quando a ideia de um filme é abordar uma grande complexidade em torno de um assunto, é impressionante como os diretores japoneses tendem a ter sucesso onde muitos outros erram. Após o aclamado Assunto de Família (2018) e seu primeiro filme em língua estrangeira, A Verdade (2019), filmado em inglês, Kore-eda volta às telas de cinema trazendo os laços familiares e a adoção como assuntos a serem esmiuçados.

Com uma trama complexa e baseada no sistema de adoção coreano, é contada a história da dupla Ha Sang-hyun (Song Kang-ho) e Dong-soo (Gang Dong-won), dois homens que recolhem crianças deixadas em uma caixa de adoção destinada a mães que precisem abandonar os seus filhos para vendê-las a casais interessados. Após Moon So-young (Ji-eun Lee) deixar seu filho, eles o recolhem e partem na missão de encontrar uma família para ele, sendo sempre seguidos pela Detetive Lee (Lee Joo-young) e Su-jin (Bae Doona). Durante a viagem, as dinâmicas vão se alterando e todos os personagens percebem que suas situações são mais complexas do que o imaginado inicialmente.
O que o diretor e roteirista consegue fazer de maneira sutil e certeira é mostrar que entre o certo e o errado, há uma gama de possibilidades de sentimentos e reações humanas - e consequentemente imperfeitas. Através de uma detalhada descrição sobre cada personagem colocada em tela de maneira pouco expositiva, compreendem-se os motivos para cada personagem estar na situação que está, relativizando os julgamentos morais iniciais que pode-se ter no início do filme. Já conhecido por conseguir tornar uma história que poderia ser relativamente simples em algo complexo, é o que o diretor consegue fazer novamente.
Esse trabalho é complementado pelas atuações naturalistas, ainda que dentro de uma esfera melodramática. Jin-eun Lee, mais conhecida como cantora do que como atriz, entrega uma performance capaz de aproximar os espectadores na medida em que a sua personagem começa a ser apresentada mais profundamente. É necessário também destacar Im Seung-soo como Hae-jin, que consegue trazer um contraponto cômico em diversas cenas mas que nem por isso deixa de emocionar quando necessário. Tal espectro de atuação para uma criança é algo difícil de se alcançar.
Ao centrar sua narrativa em algo que grande parte da população acha condenável, abandonar um bebê, o diretor consegue expandir os limites do julgamento individual a partir da explicação de que todas as pessoas possuem uma história. Isso se reflete em absolutamente todos os personagens, que parecem agir sempre como uma construção de suas experiências de vida. O detalhamento que pode diminuir em diversos momentos o ritmo do longa-metragem de mais de duas horas pode parecer inicialmente excessivo, mas consegue se justificar ao final do filme. Há ainda um grande confronto com a noção de família tradicional que consegue conversar com o público LGBTQIA+ de maneira completamente inesperada.
Apesar de não ser um filme simples de ser assistido, é um dos que a provocação permanecerá com o espectador dias após o término da sessão, algo que conversa com as obras anteriores do diretor. Ele prova, então, que consegue criar ótimas narrativas em todas as línguas.
A distribuição do filme no Brasil está sendo realizada pela Diamond Films Brasil. Verifique a programação na sua cidade.
Comentários