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Fé e Fúria (Marcos Pimentel, 2019)

Foto do escritor: Carol BallanCarol Ballan

A intolerância religiosa no Brasil é um assunto importante e muito urgente, ainda mais ao considerarmos a ascensão da extrema-direita no país nos últimos anos, confirmada nas últimas eleições. Os dados sobre o assunto apenas se tornam mais preocupantes nos últimos anos, depois de o filme ser realizado, e com isso ele parece quase uma profecia auto realizada, utilizando as eleições de 2018 como seu ponto final, mas que acabou indicando um pesadelo apenas começando para os brasileiros. Somando os dados de aumentos de denúncia de tais crimes ao relato visto no documentário sobre sua subnotificação, o cenário só se torna mais desolador ao pensar que a ele ainda foi adicionado uma pandemia cujos efeitos foram mais devastadores em regiões periféricas como as mostradas em cena.


Assim, apesar da alegria de ver um documentário brasileiro dessa importância sendo lançado, é triste pensar nos três anos entre sua trajetória em festivais e lançamento nos cinemas, mesmo sabendo que a pandemia possivelmente teve grande efeito nessa diferença. Ao mesmo tempo, considerando a proximidade de novas eleições que podem levar a uma tendência de melhora ou piora nessa situação, é melhor que tal filme esteja sendo exibido agora do que apenas após os resultados.


O retrato mostrado através de entrevistas bastante pessoais e algumas cenas das cidades ou das pessoas envolvidas é bastante complexo: uma espécie de guerra religiosa onde apenas um dos lados possui toda a força e poder de coerção, e a resistência se torna cada vez mais difícil. Ao mesmo tempo, se faz um trabalho de humanizar ambos os lados, mostrando também evangélicos inclusivos e que conseguem respeitar o direito à escolha alheia. Em alguns momentos, ele beira a dicotomia entre bem e mal, colocando apenas evangélicos como maus e pessoas de religiões de matrizes africanas como os sofredores, mas ganha-se muito ao acrescentar os pormenores de, de um lado tolerância, e do outro resistência.


Há também um grande esforço em explicar a complexidade das relações entre o tráfico, a política e a religião. Aqui, percebe-se que o documentário foi excelente em demarcar um momento de articulação do que ele se tornaria aceleradamente alguns anos depois, chegando ao cenário atual. Ter essa percepção do movimento que estava ocorrendo e conseguir acesso aos locais necessários para realizá-lo é trabalho do excelente documentarista Marcos Pimentel, cuja carreira cheia de acertos rapidamente mostra a competência. Cria-se um filme que deveria ser assistido pela maior quantidade de brasileires, independentemente de sua posição política e religião, apenas para criar consciência do uso de pessoas como massa de manobra política, algo que não é novo na história do nosso país. Quanto maior a observação e conversa sobre o assunto, menor será a capacidade de perpetuar esse ciclo, sendo essencial a sua distribuição.


Apesar de não ser um filme que reinventa a roda, Fé e Fúria consegue praticamente filmar o processo de fabricação da roda, algo incomum e relevante, e cujos resultados vivemos todos os dias.

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