Aquaman 2 - O Reino Perdido (James Wan, 2023)
Por Carol Ballan
Apesar da repaginação que está acontecendo no Universo Estendido da DC (DCEU), nem a chegada de James Gunn foi suficiente para salvar um pouco do que estava sendo planejado por Zack Snyder. Talvez sendo o último filme dessa leva, Aquaman 2 sofre com o mesmo mal de seu protagonista: está claramente entre dois mundos. Se o Aquaman (Jason Momoa) enfrenta um novo desafio com a tentativa do Arraia Negra (Yahya Abdul-Mateen) de vingar a morte do seu pai, ele acaba precisando se voltar para a própria família para conseguir as forças necessárias para se defender. Assim, ele busca seu irmão Orm (Patrick Wilson) para pedir ajuda nessa nova aventura.

A problemática que existe ao longo de todo o filme se inicia com a cena de abertura do filme: um longo discurso de Momoa diretamente para o público, explicando os fatos necessários para compreender a história até ali. Ele mistura os três elementos que estão levando as adaptações de quadrinhos a um ponto em que os filmes ficam insustentáveis, que são o leve tom cômico, a necessidade de compreender todo aquele universo para ver apenas um filme e uma forte dose de realismo, colocando-o no lugar de um pai solteiro. Só que esses elementos já estão hiper saturados na cabeça do espectador. Claro que para alguns o uso dessa fórmula leva ao conforto, mas para quem espera algo diferente ou mais ousado para a obra, haverá apenas a decepção.
Apesar da verborragia irritante do roteiro, Momoa consegue se manter bem no papel. Todas as suas participações em outros filmes do universo e até a prequela dessa obra criaram uma figura forte, deste Aquaman que consegue fazer muito mais do que apenas conversar com os peixes. Há bons momentos quando se trata da dinâmica familiar com o irmão, em um tom que fica entre a competição e a cooperação, e que se relaciona com toda a moral discursiva existente. Mas ao mesmo tempo que isso acontece, não se aprofunda muito nas intenções e desejos mais ocultos dos personagens, criando reações mais imediatistas
às situações. E então, no momento de ação e lutas no qual deveria haver uma catarse coletiva, apesar da boa técnica do diretor e atores, não há o elemento de torcida que torna cenas como essas icônicas. Há muito sendo belamente mostrado, mas parece faltar certa intenção.
Ao mesmo tempo, seria esperar demais dessa situação de reboot de um universo pensar que eles realmente se aprofundariam na criação de um herói ou vilão profundos, apenas para descartá-los em seguida. Entre polêmicas envolvendo a personagem de Amber Heard (que tem participação reduzida) e o mal momento da divisão de filmes da DC, ainda é um trabalho razoável e tecnicamente bom para um filme que se sabia que poderia afundar.
Há elementos que ressaltam o poder de Wan como diretor, como a fotografia que apesar de escura, consegue uma imersão no fundo do mar muito mais profunda do que no primeiro filme. A trilha sonora, que se mantém próxima de temas clássicos, pode ser lembrada mais do que o próprio filme. Percebe-se que há boas intenções, mas a DC não consegue fechar o seu universo com uma chave de ouro - se aproximando de novo de sua rival Marvel, que sofre de uma crise criativa.
O filme está sendo distribuído pela Warner Bros. Verifique as sessões na sua cidade.
A Fuga das Galinhas: A Ameaça dos Nuggets
Por Jean Werneck
Ilhadas no paraíso, Ginger e as outras galinhas são desafiadas pela ação antrópica novamente.
Anos depois de fugir da granja da Sra.Tweedy, Ginger vive seu felizes para sempre ao lado de sua filha, Rocky e das outras galinhas em perfeita harmonia. Contudo, o surgimento da granja Divertilândia reaviva o espírito de liberdade de Ginger, enquanto ela tenta manter sua família segura. 23 anos após a estreia de A Fuga das Galinhas, a Netflix propõe uma continuação de uma das animações stop-motion mais aclamadas do início do século sob uma nova direção.

A primeira mudança é a saída de Nick Park e Peter Lord, diretores da animação original, e a entrada de Sam Fell no comando. Apesar de significativa, fica claro que a modificação não veio para alterar a essência da obra, mas para trazer um cenário mais desafiador para as personagens em um mesmo estilo. Fell esteve à frente de projetos conhecidos - como o inventivo Por Água Abaixo (2006) e o zumbi ParaNorman (2012) - e traçou sua carreira como animador semelhantemente a Park e Lord. Sua realização em A Fuga das Galinhas: A Ameaça dos Nuggets parece não só ter sido bem-vinda como essencial para reavivar um clássico do gênero que parecia não ter uma narrativa que permitisse uma continuação. Entre os toques especiais que dão ao longa uma montagem mais ousada está a inspiração na franquia Missão: Impossível na pegada resgate em ação e no que prende o público - tanto o infantil quanto o adulto - atento em tela do início ao fim. Os mirabolantes planos e o humor por eles nem sempre darem certo são um entretenimento certeiro.
Por outro lado, o roteiro busca atualizar as temáticas da exploração animal e liberdade de consciência abordadas no primeiro longa agora com um tom mais pós-moderno. A granja não se parece mais com uma prisão - pelo menos não à primeira vista. Trata-se de um ambiente falsamente saudável para as galinhas que tange a alienação disfarçada de felicidade em prol de um consumo imediatista que satisfaça a sociedade através dos nuggets. O retorno da Sra.Tweedy, agora como uma vilá visionária do futuro, evidencia isso. Entretanto, a relação de maternidade que Ginger enfrenta nessa nova etapa com o nascimento de Molly leva o roteiro a cair em um arco narrativo previsível da protagonista. É interessante, só é batido entre as animações mais recentes tratar de relações familiares e suas complicações.
Apesar de determinados pontos de comodismo, A Fuga das Galinhas: A Ameaça dos Nuggets ainda se mostra uma continuação plausível à altura do original com trajetórias inéditas para os personagens, evitando deixar lacunas no enredo. Isso faz com o espectador se sinta satisfeito e queira começar uma revolução contra os nuggets logo após assistir o filme.
O filme está disponível na Netflix.
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