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TIFF dia 15/set: Concrete Utopia, A Normal Family, Pain Hustlers e Sleep

Foto do escritor: Carol BallanCarol Ballan

Concrete Utopia (Tae-hwa Eom, 2023, Coreia do Sul)


Iniciando o dia da programação asiática no TIFF, Concrete Utopia ganhou fama ao se tornar o candidato coreano para o Oscar 2024. Com um aumento na participação do país na premiação nos últimos anos, parece ter se criado a expectativa sobre qual será “o novo Parasita”. Inspirado em um webtoon, é contada uma história pós-apocalíptica quando ocorre um terremoto que destroi praticamente todos os prédios da região, com exceção de um. Entre os dramas da organização dos sobreviventes deste prédio, política com os sobreviventes de fora dele e a luta pela sobrevivência, nos deparamos com uma das faces mais feias da humanidade.



O filme consegue traduzir bem esse aspecto de apocalipse em meio a uma cidade gigantesca com a fotografia, que utiliza uma paleta de cores acinzentada e com um fundo azulado, criando também uma ilusão de assepsia e certa ordem perante o caos. Isso é contraposto a imagens mais solares de flashbacks, mostrando de forma bem clara a diferença entre os períodos. Também há o uso de muitos planos gerais, o que deixa bastante claro para o espectador qual a destruição e é praticamente um milagre dos efeitos especiais.


Quando partimos para os dramas mais individuais, o primeiro destaque é para uma demonstração interessante de como a sociedade coreana é altamente dividida em classes sociais, representada pelos tipos de prédios que existiam ao redor. Começamos a seguir a vida do casal Min-Sung (Park Seo-jun) e Myung-hwa (Park Bo-young) de maneira mais próxima, e através de seus olhares mais humanizados acompanhamos o horror que se segue enquanto eles aguardam alguma espécie de resgate.


No início, temos um tom mais cômico, com situações que desafiam a moral e já causam desconforto. Quando ele começa a avançar para uma espécie de autoritarismo armado que não nos deixa esquecer a militarização do país com fronteira com a Coreia do Norte, esse incômodo apenas se amplifica, criando mais uma história de luta de classes, de moral contra sobrevivência. Só que, mais uma vez, essa história é contada de maneira bastante estilizada e que consegue capturar o espectador com seu humor cortante e edição rápida, com cenas de ação incríveis.


É um filme que mostra a importância das salas de cinema, tanto por suas imagens incríveis quanto pelo seu som muito bem utilizado. A Coreia do Sul consegue, mais uma vez, se comunicar com o público sulamericano de uma maneira inesperada porém muito forte.


A Normal Family (Jin-ho Hur, 2023, Coreia do Sul)


Mais um filme sul coreano que é uma adaptação, desta vez do livro O Jantar (Herman Koch), A Normal Family utiliza outra aproximação para tratar de embates morais. Desta vez em um drama mais realista, ao invés de utilizar o apocalipse, é contada a história de dois irmãos que representam os perfeitos opostos. Jae-wan (Sul Kyung-gu) é um advogado rico que está defendendo um homem que atropelou propositalmente um homem e sua filha. Já Jae-gyu (Jang Dong-Gun) é um pediatra respeitado, que prioriza sempre a saúde e o bem-estar de seus pacientes.



Mas após uma apresentação destes personagens e suas famílias, acontece um incidente sobre o qual não falarei muito por conta de um spoiler importante, mas que envolve os filhos de ambos. Então, as questões de moral se tornam cada vez mais turvas e ambos precisam repensar fortemente em como levam as suas vidas. Ou seja, ao deixar o filme, nos deparamos com uma reflexão extremamente complexa sobre o que é certo ou errado, e como lidar com situações quando elas envolvem nossas famílias.


Este drama é apresentado de forma crescente, com cada nova cena sendo uma quebra de expectativas quanto ao que pensamos que os personagens irão fazer - mas sempre compreendendo suas motivações, ainda que não concorde com elas. Ainda que tudo que seja ruim na vida real seja ótimo para a ficção, o filme leva a sério esta máxima e consegue colocar seus personagens em situações emocionalmente extremas. E é exatamente esta coragem que dá força à narrativa, que de outra maneira poderia ser esquecível. E a performance de cada um dos atores envolvidos é o combustível para que a história seja envolvente e estressante.


Entre a opulência de uma família rica de Seul e os jantares familiares mais caóticos do cinema, os ambientes também são utilizados para contar a história de cada família, e até de cada personagem. O escritório chique contra o hospital lotado, a casa iluminada contra a que parece estar sempre em uma sombra. Tudo isso vai em uma crescente desoladora. E um final definitivamente impactante.


Pain Hustlers (David Yates, 2023, Reino Unido e EUA)


Desde que a dupla de filmes O Lobo de Wall Street (Martin Scorsese, 2013) e A Grande Aposta (Adam McKay, 2015) foram lançados e tiveram bastante sucesso de público e crítica, uma série de outros filmes tentam emular esse sucesso. Seja ao contar histórias que envolvem pessoas muito ricas de maneira estilizada, ou de falar sobre um sub nicho muito específico de maneira mais acessível, nos últimos anos não faltaram tentativas de fazer sucesso com esse estilo.



Infelizmente, mesmo com uma história potencialmente boa em mãos, é o que encontramos no novo longa-metragem de David Yates. Tratando de um assunto sério e que tem recebido muito destaque na mídia, a crise de opióides nos EUA, havia muito potencial para aprofundar a questão, aumentar consciência sobre o assunto ou entreter de uma maneira diferente e inovadora. Mas todas as decisões absolutamente genéricas de roteiro e direção levam a um filme de longuíssimas duas horas.


Liza Drake (Emily Blunt) é uma mãe solo com toda a garra do mundo para criar sua filha Phoebe (Chloe Coleman), que sofre de convulsões. Começando o filme como uma stripper sem talento para a dança, mas que sabe conversar com clientes, ela logo conhece Pete (Chris Evans). Ele trabalha em uma start-up farmacêutica e acaba oferecendo um emprego para ela no meio do flerte. E Liza é excelente em seu trabalho, mas não sabe que está vendendo um remédio para dores que, apesar de prático, é extremamente viciante.


Talvez se ele trabalhasse completamente no tom da comédia ou completamente no drama, o filme funcionasse melhor. Mas ele fica em um meio termo que tenta falar sério ao mesmo tempo em que mostra piadas sem graça. Ainda que as atuações não sejam ruins, elas são focadas em personagens sem complexidades e que apenas vão com o momento, como se as suas vidas na verdade dependessem da edição do longa.


Além disso, ele tem a dificuldade em focar em uma história que deseja contar, com Liza sendo apenas um fio condutor entre os muitos elementos que ele traz. A vida da classe média-baixa, a vida dos milionários, as falhas do sistema de saúde estadunidense, o sistema de indicações de remédios, as consequências dos remédios na vida de quem se vicia neles. Há muitos elementos acontecendo, mas nenhum deles é aprofundado o suficiente para que o espectador se importe com ele.


Assim, o que poderia ser um bom remédio acaba sendo apenas uma injeção de placebo. Pode até funcionar por duas horas, mas não adiciona nada à vida de quem o assiste.


Sleep (Jason Yu, 2023, Coreia do Sul)


Antes de falar especificamente sobre o filme Sleep, abro um parênteses pessoal para falar sobre a experiência que é assistir uma sessão do programa Midnight Madness, que foca em filmes mais ousados tecnicamente e voltados a um público mais jovem. Entre aplausos, gritos e interações com a tela, este é o tipo de sessão que, mesmo de maneira caótica e desorganizada, me lembra o quanto a arte é importante para a vida. E, mais do que isso, o quanto eu amo as salas de cinema presencial, com a possibilidade de falar sobre o filme na sua saída e a imersão completa de uma sala escura e com um bom som.



Parênteses fechados, Sleep foi uma gratificante surpresa para encerrar meu dia recheado de filmes sul-coreanos. Um terror feito em praticamente um ambiente, pautado em boas adaptações e uma ótima ideia, e que consegue manter a tensão do início ao fim. Sim, é tão bom quanto parece.


Soo-jin (Jung Yu-mi) e Hyun-su (Lee Sun-kyun) são um casal jovem e cheio de planos, com um relacionamento digno de comédias românticas, com direito até a um lulu da pomerânia. Mas toda essa alegria é interrompida quando Hyun-su começa a ter episódios de sonambulismo, e mais do que isso, faz coisas bastante estranhas durante esses episódios. Novamente, eu não quero falar muito sobre o enredo porque ele é muito importante para a construção de tensão do filme, com o ritmo dos acontecimentos sendo parte essencial de seu sucesso.


Com praticamente uma locação, dois excelentes atores e um diretor em seu primeiro filme, mas com uma capacidade incrível de contar uma história, é feito muito com pouco. Além de construir algumas imagens perturbadoras que continuam com o espectador muito depois de acabada a sessão, há uma brincadeira com os tropos de cinema de horror que fazem sorrir quem os compreende - mas não prejudica quem não entende a piada. É uma ideia simples e bem executada que lembra porque histórias de fantasmas são tão assustadoras.


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